Carlos Augusto de Medeiros
Pragmática: Psicoterapia e Cursos
Reforço a pessoa ou o comportamento?
Me. Patricia de Matos Demoly
Dr. Carlos Augusto de Medeiros
(Pragmática: Psicoterapia e Cursos)
Até quando nós, que nos dizemos Analistas do Comportamento, vamos continuar repetindo frases como “Reforcei meu cliente”; “Ela mente porque foi punida no passado” ou “Fiz aquilo para que o adolescente se sentisse reforçado”? Frases assim são corriqueiras em textos de Skinner e de outros autores. Analistas do comportamento fazem esse uso de punição e reforço à pessoa frequentemente em palestras, supervisões e em aulas para graduação e pós-graduação.
Talvez o uso corriqueiro de reforçar/punir a pessoa e não seu comportamento se configure mera intraverbalização de sentenças comuns dentre analistas do comportamento. Em termos teóricos, realmente não faz sentido falar de reforço ou punição à pessoa, uma vez que esses tipos de consequências, em suas definições, atrelam-se necessariamente ao comportamento e não ao organismo que os emite. O estímulo tem função reforçadora quando o comportamento seguido por ele se torna mais provável no futuro.
A punição é redução da frequência de um comportamento a partir dos estímulos que produz. Mas, em termos práticos, essa distinção é realmente tão importante? Será que não se trata apenas de um purismo terminológico?
Uma das metas desse texto é refletir sobre os impactos que essa distinção traz na predição e no controle do comportamento humano. Na orientação a pais, por exemplo, os cuidadores devem ser ensinados a não adjetivar a criança, mas sim, seus comportamentos. Por exemplo, dizer ao filho “Eu não gostei do que você fez. Você me desobedeceu.” é mais eficaz para descrever a contingência do que dizer “Você é desobediente”. Dizer “Estou com raiva porque você quebrou meu celular” é mais preciso do que dizer “Estou com raiva de você porque você é desleixado”. Falar da pessoa faz com que ela tenha poucas chances de mudar, uma vez que dificulta a identificação de quais mudanças de comportamento são requeridas. Os efeitos em longo prazo, porém, são os mais prejudiciais ao se adjetivar a criança e não seu comportamento.
Ao dizer para uma criança que ela é má, que é feia, irresponsável, burra etc. o adulto cria condições para seus comportamentos futuros corroborem os adjetivos. Em termos comportamentais, esses adjetivos podem funcionar como regras, sinalizando para a criança que é esperado que se comporte como tal. Mesmo os adjetivos elogiosos podem ser prejudiciais em longo prazo. Elogios como “bonita”, “forte”, “inteligente” ou “caprichosa” podem restringir aspectos da vida da criança em desenvolvimento, na medida em que pode se engajar mais nas esferas da sua vida aos quais os adjetivos foram relacionados. Assim como a possibilidade de deixar de receber os elogios pode exercer forte controle sobre seus comportamentos. Decepcionar as pessoas e deixar de receber elogios pode controlar os comportamentos da pessoa de modo a restringir a sua liberdade, além aumentar a probabilidade de cobrar-se.
Padrões comportamentais de autocobrança e perfeccionismo podem decorrer de elogios à criança e não ao seu comportamento. Em casos mais severos, a pessoa pode deixar de se expor a situações nas quais pode fracassar ou até mesmo procrastinar a exposição a tais situações, uma vez que, ao não se expor, não corre o risco de fracassar e perder o rótulo recebido na infância.
Em seu texto “What is wrong with daily life in the western world”, Skinner (1986) discute como críticas e elogios atribuídos às pessoas e não ao seu comportamento propiciam o que se denomina em psicologia e no senso comum de autoestima. Pessoas frequentemente elogiadas em certos aspectos da sua vida se avaliam positivamente e, além disso, tendem a se engajar em atividades nas quais os elogios são prováveis, como na vida acadêmica e profissional, por exemplo. Diz-se que tais pessoas têm autoestima elevada. O mesmo ocorre com a aparência, forma física e desempenho esportivo. Aparentemente, isso não parece um problema, todavia, o modo com que essas pessoas se avaliam depende muito da opinião das outras pessoas. Ou seja, caso os elogios não venham, as autoavaliações oscilam, o que costuma ser acompanhando de fortes respostas emocionais, como as de ansiedade e frustração.
Por outro lado, os julgamentos e rejeições aplicados às pessoas e não aos seus comportamentos possuem efeitos mais graves ao gerarem autoavaliações negativas. Além das respostas emocionais advindas de literalmente não gostarem de si mesmas, muitas pessoas tentam reverter as avaliações recebidas, insistindo em reatar um relacionamento após uma rejeição, por exemplo. Outro efeito é simplesmente anular alguns aspectos da própria vida, como se afastar das pessoas, evitar relacionar-se afetivamente ou, em caso mais extremos, recorrer ao autoextermínio.
Diante do exposto, a insistência no uso de reforço e punição apenas para comportamentos não é um mero purismo terminológico. Há efeitos práticos importantes e parte da contribuição da Análise do Comportamento à sociedade é justamente contribuir para que as pessoas passem a adjetivar comportamentos ao invés de pessoas. Essa discussão ainda pode se estender para outros tópicos muito importantes, como comparação e competição, mas isso fica para outro texto.
Referência Skinner, B. F. (1986). What is wrong with daily life in the western world. American Psychologist, 41, 568-574.
Em Análise Comportamental Clínica: topografia vs. função
Dr. Carlos Augusto de Medeiros
Pragmática: Psicoterapia e Cursos
Nós, analistas do comportamento, gritamos aos quatro ventos que nossa abordagem é funcionalista. Afirmamos que nossos principais conceitos são definidos com base em aspectos funcionais em detrimento dos topográficos ou estruturais.
No contexto de pesquisa básica, manter a correspondência entre o discurso e a ação, ainda que muitas vezes presumamos que certas consequências programadas sejam reforçadoras por critérios meramente estruturais ou estatísticos (e.g., doces), é relativamente fácil. Todavia, no contexto aplicado, tal correspondência é rara, senão, inexistente.
Ao fazermos nossas análises funcionais, descrevemos relações entre classes de respostas de nossos clientes e eventos antecedentes e consequentes. Sugerimos que há uma relação de determinação entre os eventos do ambiente (antecedentes e consequentes) e o comportamento alvo de análise.
Por exemplo, afirmamos que uma mulher de 56 anos apresenta o comportamento de queixar-se das agruras da vida com alta frequência diante de pessoas (estímulos discriminativos) que reforçam suas respostas verbais com atenção (reforçador positivo). O mesmo comportamento não aconteceria na presença de pessoas que não provessem atenção, se configurando em estímulos delta. Mesmo nesse exemplo, que considero um dos menos problemáticos, temos muita dificuldade em justificar o uso dos termos estímulo discriminativo, delta ou reforçador apenas por critérios funcionais.
Nos experimentos de laboratório, costumamos usar o delineamento ABA para afirmar que determinados estímulos exercem funções reforçadoras. Ou seja, para afirmarmos que a atenção dos ouvintes reforça o comportamento de queixar-se, deveríamos observar a sua frequência na presença da atenção (A ou linha de base). O ideal é iniciar pela presença de atenção, uma vez que já estamos provendo a atenção ao fazermos o acolhimento e a coleta de dados, introduzir a extinção (B) e, em seguida, reapresentar a atenção (A). Apenas se observássemos em estado estável a alta de frequência de queixar-se nas duas condições A (linha de base e retorno à linha de base) a baixa frequência na condição B, poderíamos afirmar, com base em critérios funcionais, que a atenção exerce função reforçadora sobre o comportamento de queixar-se. Um delineamento ABAB seria o mais indicado, de modo que concluíssemos o nosso experimento clínico com uma intervenção que reduziria a frequência desse comportamento a enfraquecer. É realmente improvável esse tipo de experimentação clínica quando o atendimento não serve como base para relatos de pesquisa acadêmica.
O mais comum, no dia a dia do consultório, é o terapeuta inferir a função reforçadora da atenção meramente como uma generalização de estudos de laboratório ou aplicados, do senso comum e de casos similares. Ou seja, presumir a função reforçadora da atenção com base em critérios não funcionais. Quando nos deparamos com relatos de comportamentos que ocorrem fora da sessão, como a alta frequência de mandos disfarçados em uma relação conjugal, por exemplo, as nossas categorizações ficam menos rigorosas ainda.
A própria categorização como um mando disfarçado, no caso de comportamentos relatados, se constitui em um uso metafórico do termo. Quando nossa cliente relata que “dá indiretas para o marido” acerca do que ela quer que ele faça: “o Lucas (filho do casal) está com muita dificuldade em matemática”, dizemos que o comportamento é um mando disfarçado caso ela afirme esperar que o marido tome a iniciativa de estudar matemática com o filho em decorrência de sua fala. Dizemos que, além das notas baixas do filho em matemática (estímulo antecedente), o marido se oferecer para estudar com ele controla a topografia da resposta verbal, o que a tornaria um mando disfarçado de tato. Todavia, para testar essa possibilidade, teríamos de fazer com que o marido não se oferecesse para estudar com o filho e verificar o efeito sobre o comportamento da cliente. Se ela pararia de dar indiretas ou se emitiria um mando “estude matemática com o Lucas”. Não temos controle sobre o comportamento do marido. Logo, em termos funcionais, não podemos afirmar que o marido se oferecer para estudar com o filho é o reforçador que controla o comportamento de dar indiretas e nem que as indiretas são mandos disfarçados em si. Para piorar, só temos acesso aos relatos da cliente, que podem ser acurados ou não.
Novamente, categorizamos os comportamentos de nossos clientes como tatos; intraverbais; fugas; esquivas; respostas de contra-controle; respostas impulsivas; autocontroladas etc., assim como categorizamos os eventos do ambiente como operações motivadoras; estímulos discriminativos e delta; estímulos reforçadores e punitivos; reforçadores naturais ou arbitrários etc. como metáforas ou metonímias do que observamos em situações controladas de laboratório ou em pesquisas aplicadas. Fora os usos incorretos nos quais nos baseamos em propriedades absolutamente irrelevantes dos estímulos ao categorizar os eventos com conceitos comportamentais.
Das duas uma, ou passamos a aplicar critérios mais rígidos de experimentação clínica para usar os termos da Análise do Comportamento, correndo o risco de comprometer o tratamento e o vínculo terapêutico, ou reconhecemos que, na ora da aplicação, nos baseamos em aspectos topográficos e estruturais, além dos funcionais para usar o jargão da Análise do Comportamento.
Afinal, analistas comportamentais clínicos precisam entender de princípios da Análise do Comportamento (AC)?
Dr. Carlos Augusto de Medeiros (Pragmática: Psicoterapia e Cursos)
Essa pergunta meio óbvia poderia se constituir em um dos exemplos de perguntas reflexivas frequentemente utilizadas em Psicoterapia Comportamental Pragmática.
Perguntas assim, mais do que coletar informações, têm como meta levar o terapeutizando a ponderar sobre aspectos do ambiente que controlam seus comportamentos. O mesmo vale para psicoterapeutas que se denominam analistas do comportamento.
Na minha experiência como docente, em módulos de cursos de formação e especialização em análise comportamental clínica, tenho observado três ocorrências não necessariamente excludentes:
A primeira delas é a heterogeneidade.
Há estudantes com formação sólida quanto aos princípios comportamentais. Por outro lado, há estudantes com muitas lacunas em sua formação, dentre os quais, há aqueles que estão muito tempo afastados da academia e os que escolheram a análise comportamental clínica por outras razões, que não as relacionadas à afinidade com a abordagem (preço do curso, horário, curso reconhecido pelo MEC, ter evidência empírica de eficácia etc.).
A segunda refere-se a uma verdadeira repulsa em estudar assuntos advindos de pesquisa básica e questões filosóficas. Aprender o vernáculo da AC é uma tarefa difícil e custosa. Ademais, não é óbvia a relevância dos princípios da AC na compreensão do fenômeno clínico.
Logo, os módulos de AC aplicados à clínica que abordam princípios costumam ser negligenciados por uma parcela considerável dos alunos de pós-graduação. A terceira diz respeito à nossa gigantesca incapacidade de tornar esse assunto atrativo para os estudantes na graduação e na pós-graduação.
Recentemente, concluí que pedimos demais aos nossos estudantes. Ora, vejam só, filosoficamente, solicitamos que abram mão de crenças arraigadas do senso comum, como: “somos qualitativamente diferentes de outros animais”; “Temos uma mente separada do corpo que o comanda”; “Somos livres para escolher”; “Raciocínio, memória, inteligência, emoção, motivação e personalidade explicam o comportamento”; etc.
Me pergunto até hoje como superei tantos lutos. Além disso, muitos dos métodos intuitivos de pesquisa em Psicologia (pedir a opinião das pessoas, por exemplo) são questionados e devem ser substituídos por outros muito mais trabalhosos.
A descrição dos fenômenos em AC, além de requerer o uso de uma nova e pouco amigável terminologia, rechaça com veemência as palavrinhas que o “mundo psi” adora, como resiliência, subjetividade, alteridade etc. Sem falar na sensação de vazio gerada pela defesa das explicações como sinônimo de descrições de relações entre variáveis.
Me parece, portanto, que muitas pessoas que se dizem analistas do comportamento ainda não entenderam muito bem o que isso significa ou o buraco em que estão se metendo.
O advento das terapias contextuais (Terapia de Aceitação e Compromisso – ACT, Terapia Comportamental Dialética – DBT e Ativação Comportamental, por exemplo) e a gigantesca adesão de analistas do comportamento iniciantes a tais modelos serve de evidência para as constatações desse texto. Analistas do comportamento mais puristas defenderão de modo enfático a incompatibilidade entre as terapias contextuais e a AC.
O uso de termos de segundo nível, como valores, flexibilidade psicológica, coragem e amor, característicos das terapias contextuais, por exemplo, são usados como evidência de que tais modelos não se constituem em aplicação da AC à clínica. Os protocolos padronizados de atendimento, mais característicos da DBT e da Ativação comportamental, são considerados um afastamento da postura ideográfica essencial das análises funcionais individuais preconizadas pelos analistas do comportamento.
O mesmo vale para a produção de evidências com base em ensaios clínicos randomizados a partir das categorias classificatórias do DSM-IV com o uso de estatística inferencial. Além do claro afastamento da postura ideográfica, tais pesquisas utilizam instrumentos de avaliação psicológica baseados em relato verbal como evidência de melhora, o que contraria a concepção Skinneriana de relato verbal como dado em si, e não como forma de acesso a processos comportamentais. Muitos analistas de comportamento que, por sua vez, adotaram alguma das terapias contextuais em suas práticas, argumentam que os termos de segundo nível podem ser facilmente descritos em termos de variáveis de controle.
Além disso, sustentam que tais terapias ainda partem de um modelo externalista de determinismo, o qual, para eles, seria o âmago da AC. A despeito das evidências de sua eficácia, filosoficamente, não serem exatamente compatíveis com certos pressupostos do Behaviorismo Radical, tais evidências são robustas e atendem aos critérios dos seguros de saúde americanos. Pragmaticamente falando, atendem à demanda social e é notório que a pesquisa clínica não tem como atender a todos os requisitos das pesquisas básicas de cunho experimental de sujeito único utilizadas em AC.
A despeito desse debate, se nos colocarmos no lugar do estudante de AC aplicada à clínica, começamos a entender porque o engajamento na laboriosa aprendizagem dos princípios da AC é baixo:
1. Não necessariamente esse estudante coaduna com todos os princípios filosóficos da abordagem;
2. Os termos e as relações funcionais que precisam aprender são difíceis, abstratos e longe da realidade clínica; e
3. Existem modelos que reivindicam o posto de Análise Comportamental Clínica que possuem evidências robustas de eficácia e que utilizam uma terminologia mais palatável.
Só recentemente, começamos a ter disponibilidade de cursos de formação ou especialização específicos de terapias contextuais. Logo, ainda hoje, o aluno que desejar estudá-las, deverá se matricular em um curso de pós-graduação em análise comportamental clínica geral. Para esse estudante específico, eu entendo que os módulos sobre princípios sejam meras etapas a serem cumpridas.
Em cursos específicos sobre terapias contextuais, dos quais desconheço a matriz curricular, talvez esses módulos sejam desnecessários. Por outro lado, não vejo como alguém se denominar analista do comportamento sem conhecer os princípios em profundidade.
Não me refiro a dominá-los como alguém que conduz pesquisas na área, é obvio. Porém, o psicoterapeuta que não consegue descrever os comportamentos de seu terapeutizando e as suas próprias condutas clínicas com o jargão de sua abordagem não deveria se denominar como adepto de tal abordagem.
O mesmo vale quanto a coadunar com os princípios filosóficos. Não ser um analista do comportamento não é um problema. Isso não tornará a pessoa um terapeuta necessariamente pior ou melhor.
O problema é a ausência de correspondência entre a condução de análises/aplicação de intervenções e a autodenominação como analista do comportamento. Isso realmente pode ser desastroso. Ou seja, aplicar procedimentos clínicos que não podem ser justificados com base nas relações funcionais obtidas em pesquisa aplicada ou básica em AC.
Com base na definição de um analista comportamental clínico que defendo nesse texto, portanto, é crucial sim a sólida formação em princípios de AC.
Tal afirmação, portanto, constitui em um gigantesco desafio para nós professores de AC.
Treinando habilidades sociais em Psicoterapia Comportamental Pragmática
Dr. Carlos Augusto de Medeiros (Pragmática: Psicoterapia e Cursos)
As habilidades sociais (HS) são uma demanda frequente em terapia. Nossos terapeutizandos tendem a apresentar dificuldades em negar pedidos; expressar emoções; comunicar desagrado; fazer solicitações e convites. Os classificamos com base nas dificuldades em responder de acordo com contingências sociais como inassertivos/passivos ou agressivos/abusivos. Os passivos tendem a se esquivar de situações nas quais demandas sociais são frequentes, desistindo de empregos ou cursos superiores, afastando-se de parentes e amigos. O adoecimento também pode ter função de esquiva de contextos com muitas demandas sociais. Uma pessoa pode desenvolver um quadro depressivo quando experiencia relações abusivas no trabalho, por exemplo.
O Treino de Habilidades Sociais (THS), técnica tradicional da Terapia Comportamental, é estruturado com passos específicos, como a elucidação dos déficits em HS e prejuízos daí decorrentes; treino de relaxamento; elaboração de uma hierarquia de situações em termos do nível de ansiedade; ensaio comportamental; inversão de papeis; feedback; e escalada de dificuldade.
Já a Psicoterapia Analítica Funcional (FAP) trabalha as HS na própria relação terapêutica (RT). Pressupõe-se que as demandas sociais ocorrerão na RT, de modo que um atendimento em FAP cria condições para a repetição dos padrões comportamentais do cliente em psicoterapia, reforçando-os diferencialmente, sinalizando a sua ocorrência, explicitando as suas funções e reforçando as análises funcionais feitas pelo cliente.
Essas duas formas de estabelecer as HS comungam um caráter pedagógico, onde a relação de controle exercida pelo terapeuta fica evidente. O uso de feedback verbal, instruções e reforçamento arbitrário tornam o terapeuta praticamente um professor. Por mais que intervenções dessa natureza possam ser eficazes, diminuem a probabilidade de os terapeutizandos desenvolverem o próprio estilo de se relacionar, assim como não estimulam a sua independência.
Como a Psicoterapia Comportamental Pragmática (PCP) procura desenvolver a independência e a sensação de liberdade do terapeutizando, os modos que emprega para tornar mais frequentes respostas julgadas socialmente habilidosas tendem a ser menos pedagógicos. Para tal, utiliza a própria RT e o Treino de Habilidades Sociais Assistemático (THSA).
De forma similar à FAP, a RT também será utilizada como instrumento de intervenção sobre as HS. Todavia, em PCP, o terapeuta não sinaliza para o terapeutizando como ele se comporta na sessão, e sim, lhe solicita a descrever o próprio comportamento.
Por exemplo, se um terapeutizando reponde “não sei” a diversas perguntas do terapeuta ao longo da sessão, esquivando-se de alguns temas, o terapeuta pode fazer a seguinte questão: “quantas vezes você me respondeu ‘não sei’ hoje?” ao invés de perguntar “você percebeu que já me respondeu ‘não sei’ diversas vezes na sessão de hoje?”. Ademais, o terapeuta não devolve as análises funcionais desses comportamentos e sim, utiliza perguntas abertas encadeadas (i.e., questionamento reflexivo) para que o terapeutizando passe a analisar os comportamentos que emite na sessão. Portanto, em PCP, ao invés de dizer para o terapeutizando:
- Você respondeu “não sei” todas as vezes que questionei qual o seu papel no modo como a sua família te trata, o que talvez seja uma tentativa de evitar lidar com situações nas quais precise assumir responsabilidades. Me parece que você ainda não tem confiança na nossa relação para apenas pedir que mudemos de assunto.
são feitas perguntas do tipo:
- “Como você se sente ao falamos da sua família?”; “Como é para você quando pergunto sobre o seu papel nas coisas que acontecem contigo?”; “O que ocorre quando respondemos ‘não sei’ a uma pergunta?”; “Que reação você gostaria que eu tivesse quando diz ‘não sei’?”, “Se não queremos falar de um assunto, o que normalmente dizemos?”; “Como seria para você dizer isso para mim?”. Com esse procedimento, espera-se que o terapeutizando desenvolva um repertório analítico que lhe permita identificar os determinantes de seus comportamentos de modo autônomo.
O terapeuta também modela as respostas de seu terapeutizando utilizando as consequências mais próximas daquelas que ocorrem no dia a dia. Ou seja, ao invés de criticar as respostas “não sei”, ou elogiar quando o terapeutizando pede para mudar de assunto (e.g., “fico feliz que dessa vez você confiou em mim para apenas pedir para mudarmos de assunto”), em PCP manteremos a pergunta ou ficaremos em silencio até que ele a responda ou peça para falar de outra coisa. Quando ele pedir para mudar de assunto, simplesmente, o faremos. A consequência natural tal comportamento é a própria mudança de assunto em si, e não um elogio.
Já o THSA ocorre de modo espontâneo ao longo das sessões. Inicialmente, com base na entrevista e nas observações clínicas, o terapeuta identifica as HS como demanda, assim como procede análises funcionais dos operantes envolvidos. Durante as sessões, espera relatos de demandas sociais (e.g., o relato de um pedido de dinheiro emprestado de um amigo que nunca paga). Nessas situações, o terapeuta propõe a simulação, ora exercendo o papel das outras pessoas, ora exercendo o papel do terapeutizando.
Ao exercer o papel das outras pessoas, o terapeuta tentará simular como elas reagem às falas do terapeutizando, de modo a aplicar um reforçamento diferencial mais próximo do natural possível. No exemplo do amigo pedindo o dinheiro emprestado, caso o terapeutizando negue de modo inassertivo (e.g., “acho que não vou poder te emprestar, tenho andado tão apertado”), o terapeuta insistirá no pedido. Caso negue de modo assertivo, o terapeuta, simulando o amigo, não insistirá. Além disso, são feitas perguntas ao terapeutizando para que identifique quais aspectos topográficos de sua fala resultaram nas consequências providas pelo terapeuta, o que pode ser favorecido com a troca de papeis. Ao fazê-lo, o terapeuta solicita que o terapeutizando avalie os efeitos de seu comportamento nas outras pessoas: o terapeuta, ao invés de fornecer feedbacks sobre o desempenho do terapeutizando, solicita que ele mesmo se avalie.
Um elemento fundamental dos dois procedimentos em PCP é levar o terapeutizando, por meio de perguntas, a reconhecer que nem sempre as respostas assertivas serão reforçadas. No início, é provável que as pessoas do convívio do terapeutizando punam suas respostas socialmente habilidosas, sendo fundamental a manutenção do responder socialmente habilidoso para que as contingências se modifiquem.